A herança

Recebi em 02/11/2024


...E o tempo avança, inexoravelmente,
a caminho do fim...
ou do princípio, como outros dirão,
no entanto, eu estou bem ciente
de que, quer seja assim,
ou talvez possa ser não,
quando se parte, tudo se perderá
nas cinzas do esquecimento.

De início, um ou outro lamento,
uma lágrima de circunstância,
depois é uma vida que se apagará
como um leve sopro do vento
que, por entre os escombros,
não dá importância
ao pó que carrega nos ombros
para lugar distante.

Gostaria que algo perpetuasse
uma tão breve permanência,
algo que deixasse
uma visão subtil, desconhecida,
duma existência
avessa a desnudar-se, por temor,
que transpirasse todo o amor
que sentiu na vida.

Não, não me lamento nem me queixo,
mas sei que, afinal, apenas deixo
uma palavra perdida
em poesias que ninguém compreende,
em cartas por enviar,
em escritos de ocasião.

E estas palavras nada mais são
que a tentativa frustrada
de saber que alguém entende
o que se esconde por entre o nada
das entrelinhas por decifrar.

Resta-me sempre a esperança
de que tantas palavras a esmo
possam ser lidas, assim mesmo,
com uma certa dose de imaginação,
numa tarde calma ou num serão,
como uma fraca e pequena herança
dum passado no presente,
duma simples e fugaz imagem de mim…
que o tempo avança, inexoravelmente,
a caminho do fim...



António Barroso (Tiago)


 


 

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