Mostarda


            Não me lembro mais do nome dela, mas era uma mulata com um corpo muito bonito, dentes perfeitos e um sorriso provocante. Trabalhava como doméstica na casa do Plínio, um amigo nosso. Apartamento pequeno, somente ele e o pai, isto permitia que ela cuidasse com tranqüilidade da arrumação da casa e ainda preparasse as refeições. Nessa época deveríamos ter em torno de treze anos.

            Certo dia ele veio todo eufórico dizendo que a tinha comido. Naquela época era muito difícil, com a nossa idade, arranjar mulher para transar. Conhecíamos algumas profissionais, mas a nossa mesada era bem inferior ao que elas cobravam na época. Bem que tentávamos convencê-las a nos dar de graça, afinal seria um bom investimento. Assim que crescêssemos, prometíamos, teriam seus favores sobejamente reconhecidos. Mas, nada feito. Elas não se deixavam comover com os nossos infantis apelos.

Assim sendo, aquele episódio nos abria uma razoável perspectiva. Bastava que o Plínio, em nome da nossa amizade, fizesse com que ela estendesse os seus favores a nós. Afinal, como sempre se dizia de brincadeira, em casa de pobre, onde come um comem cinco. Este cinco representava exatamente o nosso grupo de . Após longa discussão, conseguimos finalmente convencê-lo a, pelo menos, tentar. Ficou combinado então que ele procuraria uma ocasião oportuna para expor o nosso aflito desejo. Foram dias de angustiante espera, afinal, a simples perspectiva de uma hipotética transa nos excitava.

Os dias se passavam e não vinha a confirmação tão desejada. Sempre com evasivas, dizia que a oportunidade de falar com ela não tinha se apresentado. Fingindo indignação, o acusávamos de não estar sendo amigo. Na época, a palavra amigo pesava bastante. Diante da possibilidade, remota é verdade, de nos afastarmos dele, decidiu, enfim, nos atender. Com isto, a angústia reiniciava.

Desta vez, porém, o sofrimento foi menor. Decorridos dois dias, veio a notícia tão aguardada. Ela tinha concordado e, melhor ainda, o pai dele teria de viajar a negócios...

Na noite seguinte, excitação total. Havia, no entanto, uma exigência. Não poderíamos usar a cama dele e muito menos, a do pai. Teríamos de nos virar com uma cama de abrir (dragoflex) que eles tinham, muito comum na época. Nessa altura, até em cima da cadeira resolveria. Feito o sorteio para estabelecer a ordem de subida, fiquei em terceiro, nada mal... E assim, ela foi enfrentando um a um, galhardamente. Aconteceu, no entanto, que com a refrega, ela começou a suar e, surpreendentemente, a exalar um forte cheiro de MOSTARDA. Daí o apelido que passou a ter entre nós. Como na época predominava o deliciosocachorro quente com mostarda”, do Bob’s – que, por sinal, comíamos sempre com renovado prazer - não nos foi difícil superar este pequeno detalhe. Além do mais, era de graça!

Com o retorno do pai, transferimos nossas noites de prazer para as areias da praia. Por algum tempo desfrutamos desta inesquecível doação. Não ficamos sabendo o motivo pelo qual, decorridos alguns meses, resolveu sair do emprego e nunca mais a vimos.

Até hoje, quando como mostarda, me vem à lembrança aquela adorável mulata.

Domingos Alicata
Rio de Janeiro - RJ - 27/05/2005




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