Recebi em 10/10/2010

Uma surpresa para Nini

Nini acordara feliz, naquela manhã.

Sua casa nova estava quase pronta.

As chuvas do mês de março foram intensas e acabaram por des-truir o pé de Monstera que lhe servia de morada.

Seu amigo Samuel conseguira para ela uma nova morada, que se localizava no mesmo jardim.

O grilo Samuel viera buscá-la para verem a nova moradia.

Desta vez, ele escolhera um local mais elevado, onde as águas de chuva não conseguiriam mais carregar a sua casa.

Mal Nini acabara que fazer seu desjejum, Samuel já  estava a chamar-lhe:

_ Vamos, Nini!

Aquela planta não ficará esperando por ti muito tempo!

_ Já vou, Samuel!

Espere apenas eu colocar meus sapatos!

E lá se foram eles até o local, onde seria o novo lar de Nini.

Ela estava muito ansiosa para conhecer o novo local.

Desde que a enxurrada levara sua casinha, estava morando com Samuel.

Ele era um bom amigo, gentil, educado, mas Nini sentia-se desconfortável na casa dele.

Afinal, grilos e joaninhas têm hábitos diferentes.

Voaram alguns metros, mas como eram pequenos, o seu voo pa-receu a eles, ter muitos quilômetros.

Chegaram a uma grande construção branca, com uma enorme varanda.

Gigantescos vasos estavam colocados, na amurada daquela saca-da e deles pendiam uma profusão de flores e folhas, que encan-taram o olhar de Nini.

_ Que lugar de sonho, Samuel! – exclamou Nini, mal conseguindo conter seu encantamento.

_ Gostaste, mesmo? – perguntou o grilinho.

_ É aqui perto que será a minha nova casa?

_ Sim, Nini!

Será ali, num daqueles vasos de onde pendem aquelas flores grenás.

Vamos até lá!

Eles bateram asas mais um pouquinho até pousarem no parapei-to da mureta que cercava a varanda.

_ Em qual deles irei morar? - perguntou ela com seus olhinhos inquietos.

Todas as flores eram tão lindas, com tantos matizes...

Era quase impossível pensar que haveria um local desocupado para ela.

Samuel segurou a mão de Nini conduzindo-a ao último vaso.

Lá se achava uma joaninha mais idosa.

Sua carapaça não brilhava tanto e as bolinhas antes pretas, co-meçavam a embranquecer.

Nini olhou para a joaninha-anciã e de pronto simpatizou-se com ela.

_ Bom dia, Dona Adelina!

Como tem passado?

_ Bom dia, Samuel!

Ando um pouco cansada.

Já não consigo mais voar como antes!

Esta linda joaninha preta de bolinhas vermelhas é Nini?

_ Sim, senhora, eu sou Nini!

A senhora é muito gentil.

Minhas bolinhas são falsas!

_ Eu sei, minha filha, Samuel contou-me sua história!

Mas vamos entrar!

A casa de dona Adelina era a legítima casinha da vovó.

Tudo tão arrumadinho, os móveis limpinhos, lindas toalhas de crochê sobre os móveis.

Num canto da sala, havia uma mesinha redonda com  muitos porta-retratos.

Nini olhou para eles com atenção.

_ São seus filhos? - perguntou ela curiosa.

_ Não, são meus sobrinhos!

Eles vivem em Portugal.

Faz muitos anos que vim para o Brasil!

_ E nunca mais viu sua família?

Os olhos de dona Adelina encheram-se de lágrimas e sua voz calou-se.

Samuel interviu:

_ Não falemos mais sobre isso!

Dona Adelina tem saudades de Lisboa, mas não tem mais idade para viajar até lá.

_ Desculpa se a fiz chorar com minhas perguntas!

_ Não tem problemas, minha filha.

Sou apenas uma velha joaninha chorona!

_ A senhora é querida!

Faz lembrar minha mãezinha que está no céu das joaninhas!

_ Querida, és tu!

Será um imenso prazer ter a tua companhia nesta casa!

_ Como, Samuel?

Eu vou viver aqui! - exclamou ela surpresa.

_ Sim!

Não te agrada, Nini?

_ Muito!

Eu nunca pensei que poderia viver num vaso tão lindo e com uma senhora tão simpática.

_ Então, Nini!

Seja bem-vinda ao meu vaso de sardinheiras!

_ Sardi... O quê? - perguntou ela, confusa.

_ Nini! – falou Samuel, _ Sardinheiras é o nome dos Gerânios lá em Portugal.

_ Ah!

Compreendi!

Desculpam a inha ignorância, dona Adelina!

_ Não fique a preocupar-se, filha!

De agora, em diante temos muito tempo para acertarmos as diferenças de vocabulário.

Eu sou velha cá no Brasil, mas não consigo esquecer a maneira de falar de minha terra!

- Eu vou para minha casa!

Adeus, Nini!

Adeus, dona Adelina!

Fizeram as despedidas.

Samuel partiu contente, pois mais uma vez tinha conseguido ajudar sua amiga Nini.

As duas seriam muito felizes juntas, pois ambas não tinham mais nenhum parente por perto.

Passaram-se os dias.

Nini e dona Adelina tornaram-se muito amigas e até confidentes.

A joaninha mais nova gostava de ouvir as histórias e experiên-cias de sua amiga mais idosa.

Certa manhã, ao acordar Nini teve uma surpresa que a fez sair pela casa aos berros, assustando dona Adelina.

_ O que houve, Nini? – perguntou a anciã.

_ Olhe, mamãe Adelina, minhas asas!

Dona Adelina colocou os óculos e vagarosamente aproximou-se de Nini.

_ O que tem de errado, menina?

_ Minha carapaça está vermelha com bolinhas pretas?

Milagre!

_ Não, Nini, não é milagre!

Eu vou te explicar.

Nós, as joaninhas, somos insetos e os insetos sofrem ecdises ao longo de suas vidas.

_ Ecdise!?

Que é isto, afinal?

_ Vê-se mesmo que és jovem, muito jovem!

Os insetos mudam as suas carapaças para que seus corpos pos-sam crescer.

Esta deve ser a sua primeira ecdise, por isso o susto.

_ Como fiquei vermelha?

Eu era preta, todinha preta!

_ Isto sim pode ter sido um milagre, minha filha!

Um grande milagre!

Denise Severgnini


 

 
Anterior Próxima Histórias Poesias
 
Menu Principal