Muito comum, meu irmão mais velho, Paulo, trazer tudo quanto era
"bichinho" diferente e ou machucado, que nin-guém queria, para casa.
Mamãe ficava "enlouquecida" e nós, Carlos,
o mano mais novo e eu, adorávamos.
Era prazeroso estar em contato com diferentes criaturi-nhas... jacarés, lagartos, macacos, aranhas, corujas, pre-ás, besouros, nada de animais comuns como gatos, ca-chorros ou canários
e coelhos... estes, tínhamos aos mon-tes... rs.
Certa vez Paulinho telefonou e disse para mamãe:
- Mãe, posso levar um cabrito pra casa? Ganhei um!
Mamãe, já escolada
pelas excentricidades do moleque, in-dagou logo:
- Vivo ou morto?
-
Ora mãe, vivinho, todo pretinho e branco.
- E onde iremos colocar um cabrito vivo, Paulinho?
- No quintal, mamãe.
- E os vizinhos, filho?
O cabrito vai berrar dia e noite e em apartamentos não se pode ter
este tipo de bicho, mesmo em coberturas.
- Ah!
- Não traga não, por favor!
Ouviu bem, menino?
- Tá certo, mãeee...
Mas este menino, tratado assim, já era um jovem servindo os Paraquedistas do Exército e não mais uma criança...
Ah,
meu irmão... só fazia loucuras e nós dois os menores, vibrávamos de emoção e alegrias incontidas.
Passados alguns anos de uma certa calmaria,
chega ele em casa, uma noite, com uma cobra, toda verdinha e bem fina com mais ou menos um metro e meio de comprimento.
Sua pele era lustrosa e muito bonita.
Mas inspirava medo.
Não dava para chegar muito perto.
Ninguém tinha coragem para dar uma
olhadinha mais deta-lhada.
Nossa cachorrinha de estimação deu de latir até mais não poder.
Sinalizando situação de perigo, latia e pulava pra trás co-mo
quem alertasse:
Sai bicho peçonhento, sai já daqui!
Aqui é meu pedaço. Muito hilário...
Como já era tarde da noite e não havia como se livrar da cobra, Paulo teve a brilhante ideia de colocá-la num garra-fão que nos servia de enfeite.
Mas como tampar
a boca do garrafão, sem matar a dita cu-ja?
A cobra tadinha ficaria sem ar...
Seria preciso algo furadinho tipo filó ou similar...
Procuramos pela casa e não
encontramos nada.
Mamãe, para salvar a situação, como sempre, deu uma perna de sua
mais nova meia de seda.
Naquele tempo as meias das senhoras eram de nylon e não as
meias-calças de agora...
Paulo arrumou a meia na boca do garrafão, depois de colo-car a cobra lá dentro com jeito, passou um forte elásti-co de escritório para ficar
bem firme.
Solucionado o problema, fomos dormir.
Era uma noite quente de verão e com muito calor, resolve-mos dormir no terraço ao relento... vendo e contando es-trelas...
Morávamos num apartamento de cobertura.
Era noite de luar
e a luz forte refletia até no final do cor-redor que tinha uns sete metros de comprimento, onde foi colocado o garrafão com a verdinha dentro.
Fomos dormir despreocupados em nossos colchonetes de
verão.
Lá pelas tantas, mamãe resolve ir ao banheiro e ouve-se um grito abafado:
- Ai, Minha Nossa Senhora!
Uma confusão generalizada se seguiu ao
grito e sonoras gargalhadas ecoaram pela varanda iluminada apenas pela luz da lua...
Uma pequena cobra
rastejando pelo chão com uma meia de seda enfiada na cabeça presa por um elástico...
Cachorra
latindo, gritaria generalizada por não se saber o que fazer.
Como prender a bichinha novamente?
Como voltar a dormir com sossego?
Como afastá-la de mamãe que estava
mais perto?
Paulo não teve dúvidas: passou a mão no seu trinta e oito, na época
ele era Detetive de Polícia e portanto tinha porte de arma, deu um tiro certeiro na coitada.
Ela estava ameaçando mamãe com um bote, ainda enfiada na meia e tudo o mais...
Foi aquele silencio!
- Nunca mais me faça uma coisa dessas, está me ouvin-do? falou mamãe tão baixo que parecia sussurrar.
Até hoje não sabemos se
por receio da cobra ou do tiro...