Luíza, veio
especialmente de Minas Gerais para trabalhar na casa de
vovó Albertina. Seria acompanhante e babá das crianças.
Era uma senhora simples, educada, de fala mansa,
trabalhadora e gos-tava muito de crianças.
Aparentava
idade indefinida.
Algo entre 38
e 45 anos.
O tempo foi
passando e Luíza foi ficando como se fosse membro da
família.
Adorava as
meninas, as quais chamava de "Minhas Lindas Meninas",
no caso: mamãe Judith, tia Emília e tia Beatriz, a
caçula.
Assim era Luíza. Imaginem que possuía um noivo, o
Clodoaldo, que morava em Minas Gerais em casa da mãe.
Ele não sabia ler nem es-crever.
Era de origem
humilde, como Luíza, ótima pessoa no trato. Ambos iam
levando o noivado como podiam, lá ia uns oito anos de
namo-ro...
E Luíza, vez
por outra, quando batia a saudade ou ficava triste,
vi-via se queixando pelos cantos da casa e com vovó, que
o casamen-to estava demorando demais a ser marcado.
Fato este com
o qual vovó concordava plenamente.
Durante o
período de noivado, correspondiam-se via correio,
atra-vés da mãe do rapaz, que por ter patroa exigente,
sabia ler e es-crever. Portanto, D. Maria Rita, mãe de
Clodoaldo era o elo de li-gação deste namoro entre o
filho e a tão estimada Luíza.
Minas Gerais
/ Rio de Janeiro, uma vez por mês!
Certa manhã para surpresa de todos, chega uma segunda
carta no mesmo mês.
Mais que
depressa Luíza pega a carta, abre e começa a ler ali no
meio do corredor. Algum tempo depois, ouve-se um choro
descon-solado invadir os cômodos da casa.
Ai! Ai! Ai!
Não pode ser! Lamentava-se a voz...
Vovó que
costurava no quarto ao lado ouve a choradeira e vai para
a cozinha saber o que estava acontecendo por lá.
Encontra
Luíza debruçada sobre a mesa com os olhos vermelhos e o
nariz congestionado de tanto chorar... esfregava as
mãos, puxava o lenço dos cabelos, enfim, aflita demais.
- Não é
verdade, D. Albertina.
Não pode ser
verdade!
Só se
Clodoaldo arranjou outra noiva por lá.
E abria o
berreiro outra vez...
- Onde está a
carta, rapariga? Perguntou vovó.
- Aqui! E
Luíza retira o envelope todo amassado do bolso do unifor-me.
Sem dizer uma
só palavra, vovó lê a missiva.
Após a
leitura, vó Berta olha bem o envelope e observa dois deta-lhes que passaram despercebidos.
O primeiro
deles: não havia endereço nem o nome do remetente.
O segundo
fato: o selo da carta vinha com o carimbo do Rio de
Ja-neiro, especificamente da Praça Onze, bairro onde
residiam à épo-ca.
Além do mais,
a letra da carta era conhecida por vovó.
Muito
semelhante a uma que ela ajudara a se firmar na alfabetiza-ção.
Vó Berta não
tem mais dúvidas.
Prendendo um
sorriso, chama suas duas filhas mais velhas que es-tavam
fazendo os deveres escolares.
- Judith e
Emília, venham cá!
As duas
correm para a cozinha bem depressa.
Mamãe com
nove anos e tia Emília com oito de idade.
- Podem me
dizer o que significa isso?
E vovó aponta
e mostra a carta para as duas...
Já prevendo o
castigo, as explicações vieram numa torrente de
lá-grimas...e as duas, envergonhadas e atrapalhadas não
sabiam como se justificar.
- Mamãe,
falou tia Emília a mais extrovertida delas, resolvemos
desmanchar logo este noivado porque está demorando
demais e a Luíza, tem pressa e vive se queixando todo
dia. Quer casar e não consegue.
É melhor ela
namorar Seu Armando do armazém do vovô que está aqui
pertinho e gosta muito dela.
Seu Armando,
diga-se de passagem, era um empregado muito esti-mado por
todos e tinha lá uma quedinha pela Luíza, não
esconden-do de ninguém. Vivia atrás da mulata!
- Ah! Então
foi assim?
As "moçoilas
engraçadinhas" resolveram por conta própria bancar as
sabichonas, não é mesmo? De volta para a sala porque
temos muito o que conversar...
As meninas
saíram em disparada pedindo desculpas e perdão a pobre
Luíza que ainda estava atordoada...
- Desculpas,
Luíza, nos perdoe, sim? Desculpas, gritavam pelo
cor-redor à fora... pensamos que era melhor para você
se casar com o Seu Armando.
- Suas
"Meninas Perversas"! Como pode!
Como puderam
fazer isso comigo?
Tão "pequeninhas
e tão marvadas"...
Ai! Meu Deus
do Céu!
Minhas
Meninas Lindas e Tão "Marvadas"!
Ai! Ai! Ai! E
cada vez mais Luíza caía num choro convulsivo...
Não se
conformava com o ocorrido.
Vovó só
conseguiu acalmá-la depois de um certo tempo... Luíza
en-tão pediu-lhe que não castigasse mais as suas "Lindas
Meninas". Que tinha sido uma travessura de crianças...
Mas vovó não
contemporizou.
Foi falar com
as meninas, que lívidas de medo e apreensão a espe-ravam.
Lógico que as
duas receberam um castigo.
Mas foi um
castigo leve devido a pouca idade.
E não sem
antes vovó explicar bem claramente que não se interfe-re na vida dos outros. Que as "Escolhas" feitas,
pertencem a cada um e que cada pessoa arca com as
responsabilidades e as conse-quências daquilo que
faz e escolhe... como no presente caso. En-tendem, meninas?
As meninas
entenderam perfeitamente. Aceitaram o castigo e
pro-meteram nunca mais fazer nada semelhante. E jamais
fizeram!
Serviu de
lição, muito mais, a mágoa, a dor, o choro desconsolado e a aflição que viram estampados no rosto da tão
querida e idola-trada Luíza.
Assim se educava antigamente. Com justiça, respeito aos
mais ve-lhos e semelhantes e muito diálogo.
Mas os
castigos, também seguiam juntos.
Hoje estamos
todos aqui e bem educados... rs.
Que saudade
temos de você vovó tão querida e tão sábia.
Tenho a
certeza de que suas "lições de vida" passarão para as gera-ções futuras.
Nos
encarregaremos disso porque nos orgulhamos delas e de você, esteja onde estiver.
Ah! E quanto a Luíza e Clodoaldo, casaram-se no ano
seguinte com uma linda festa preparada por meus avós.
Pensamos que a "Carta Anônima" deu um empurrãozinho no ânimo do noivo... rs.