O Velho e o Idoso


        Dois antigos amigos encontram-se, casualmente, anos de-pois de um longo afastamento por razões alheias às suas vonta-des, levados que foram por caminhos diferentes, em busca de um sucesso profissional e outras aspirações não menos plausíveis.

        O IDOSO estava com 78 anos de idade e o VELHO um lustro mais novo, com 73 anos de sobrevivência, digamos assim!

        O encontro ocorreu na fila do caixa de uma farmácia. O IDO-SO tinha comprado um complexo vitamínico para sua complemen-tação alimentar. O VELHO comprara uma série de remédios pre-ventivos para satisfazer sua incurável hipocondria.

        Sentaram-se no banco de uma praça próxima e começaram a falar sobre amenidades das saudosas reminiscências dos tempos de outrora.

        O VELHO usava um chapéu de abas mais largas que as nor-mais, para resguardar-se do sereno da noite e queixava-se da fria-gem que sentia e lamentava não estar usando um agasalho mais espesso. Não poderia demorar-se por muito tempo por causa do or-valho...

        O IDOSO deleitava-se com a suavidade da brisa que a noite lhe soprava e contemplava o céu estrelado que emoldurava uma linda lua cheia, prateando o chafariz que jorrava contínuos e ale-góricos esguichos d’água.

        O VELHO descobriu uma pequena e acanhada nuvem acomo-dada naquele cantinho celestial e temia que uma tempestade esti-vesse próxima a se desencadear. Ele, inexplicavelmente, carregava um guarda-chuva.

        O IDOSO comentou sobre as roseiras que enfeitavam e perfu-mavam o jardim da praça. Eram rubras, amarelas, brancas, róse-as... um florido arco-íris pintado em aquarela pelas mãos de Deus.

        O VELHO lamentou que os galhos eram cheios de espinhos que arranhariam aquele que das roseiras se aproximasse. Preferia man-ter-se distante e não podia sentir qualquer olor por estar constan-temente resfriado, por uma crônica rinite alérgica que o acomete-ra anos atrás. Sempre levava consigo um preventivo par de lenços.

        O IDOSO convidou o VELHO a dar umas voltas pelas cercanias para andar um pouco e manter a forma física em dia. O VELHO disse que não se sentia disposto e preferia manter-se senta-do, alegando que se andar fizesse bem, todos os carteiros só morreriam depois dos cem anos. O IDOSO desistiu de explicar-lhe que os carteiros  carregavam malotes pesados com correspondên-cias e encomendas postais, subiam ladeiras sob sol ou chuva, usavam roupas inadequa-das ao clima que fizesse, qualquer que fosse ele, quente ou frio. Isso não era saudável e em nada contribuía para suas longevidades.

        O VELHO disse que passava a maior parte dos dias de sua aposentadoria, aboletado em uma cadeira de balanço assistindo televisão, beliscando variados tipos de petiscos, tomando cafezi-nhos e pitando seus cigarros. Pouco comia às refeições, talvez por isso sentia-se constantemente cansado.

        O IDOSO pertencia a um clube social em que fazia hidrotera-pia, frequentava uma escola de danças todas as tardes, exceto às segundas e quartas-feiras quando tinha aulas de violão. Adorava a vida, ouvir boas músicas, encantava-se com o sorriso de uma crian-ça, as carícias de uma mulher, a chilreada dos pássaros, o verde das matas, os animais, o sol, a chuva, a primavera, o verão, o outono, o inverno e todas as outras benesses e criações de Deus!

        O VELHO não ligava muito pra “essas bobagens”, pois tudo es-tava lá por obra do acaso. Não tinha tempo de admirar estes “sim-ples detalhes” que iam e vinham sem influenciar em nada no seu modo de viver e ver as coisas. Apertou-me a mão sem muito vi-gor e despediu-se dizendo que já era tarde e que tinha que retor-nar à sua casa, pois estava na hora de tomar seus remédios, antes de deitar-se.

        Mostrei-lhe o bebedouro ali perto, caso quisesse tomar algum comprimido que comprara na farmácia e, assim, poderíamos per-manecer mais tempo o nosso “papo”. Disse-me que já se acostu-mara a engolir os comprimidos a seco, pois nunca sentia sede e pouca água bebia.

        Desejei-lhe felicidades e aconselhei-o que parasse de olhar tanto para o chão, pois lá no alto é que estavam as coisas boas para serem apreciadas, inclusive nosso Divino Deus  para conduzir nossos passos e iluminar nosso caminho com sua Divina Luz.

        Fez um muxoxo de descrença, tirou um pigarro da garganta e afastou-se meio curvado, alquebrado...

        Pobre VELHO de 73 anos, jamais conseguirás ser um IDOSO de 78 como eu. De bem com a vida, de bem com o próximo, sufocan-do eventuais prantos, contornando ou arrostando problemas, dese-nhando um sorriso constante em meu semblante, distribuindo oti-mismo ao meu redor, sempre que possível! E, nos intervalos, escre-vinhando uns poemas, crônicas e contos. Receita para uma saudá-vel longevidade, com a ajuda da Graça Divina!

        CONFORMO-ME EM SER UM IDOSO, MAS JAMAIS QUERO EN-VELHECER! QUANDO CHEGAR-ME A DERRADEIRA HORA, QUE LEVE COMIGO UM JOVEM CORAÇÃO, INDA CHEIO DE AMOR PRA DAR!

Ary Franco
(O Poeta Descalço)




Fundo Musical: Red roses for a blue Lady - Vic Dana
 

 
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