Olavo desceu para o refeitório lá pelas 8:00h e pensou em Marcela na
cozinha, às voltas com sua faina culinária. O café da manhã era oferecido
aos hóspedes à moda “self-service”. Ele esco-lheu o que lhe pareceu mais
apetitoso e procurou uma mesa vaga, com a bandeja bem suprida nas mãos.
Procurou comer bem lenta-mente na esperança de sua admirada aparecer. Sem
lograr êxito, desistiu e saiu meio entristecido.
Quebrando a regra que ele mesmo lhe impôs, às 8:40h deu uma passada no caixa
eletrônico do Banco e sacou R$12.000,00 para “despesas
imediatas e eventuais”.
Logo em seguida iniciou suas voltas pelos quarteirões próximos, buscando
aprender aquilo que a vida ainda tinha para ensinar-lhe.
Até as 10:20h, nada lhe chamando a atenção, resolveu com-prar o jornal e
sentar-se no banco da praça para lê-lo. Tinha que enganar o tempo para ver
Marcela na hora do almoço. Mal tinha li-do as manchetes, sentiu uma mãozinha
sopesando umas moedas cutucar-lhe o braço.
__ Moço, pode me dar uma ajuda?
__ Quantos anos você tem?
__ Nove
__ Qual seu nome?
__ Pedro
__ Isso não é hora de você estar no colégio?
__ Eu só vou de tarde. De manhã ajudo mamãe a ganhar um dinheirinho pra
gente comer.
__ Você não tem pai?
__ Tinha. Mas ele largou nóis.
__ Onde está sua mãe?
__ Ali! E apontou seu dedinho para uma senhora aparentando estrema penúria,
considerando seu mal trajar.
__ Como ela se chama?
__ Glória
__ Eu vou dar uma ajuda, mas não quero que você ache que é uma esmola. Estou
pagando uma aula que você acaba de me dar sobre um mundo que sempre mantive
em minhas costas, negando-me a aceitar sua existência.
Olavo pegou uma nota de
R$100,00 e entregou-a para o Pedro.
__ Que é isso? Isso não vale!
__ Esse papel aí é a mesma coisa que um montão de moedas. Leva agora e
entrega pra sua mamãe. Combinado?
Meio desconfiado ele olhou para aquele papel azulado e foi ao encontro da
senhora sua mãe. A distância e o barulho do chafariz impediu-o de ouvir o
diálogo de ambos. Ela pegou a nota, exami-nou-a frente e verso e fez uma
pergunta ao filho. Pedro apontou para Olavo que deu um “tchauzinho”
para ambos.
Para surpresa de Olavo, ao invés deles continuarem sua men-dicância, vieram
ao seu encontro. De pé ele recebeu-os.
__ O Sr. deu esta nota pro meu filho? Ela é de verdade? Não quero confusão
com a “poliça”.
__ Pode ficar tranquila Da. Glória. A nota é verdadeira e espe-ro que essa
quantia lhe ajude de alguma forma.
__ Vai ajudar muito e peço que Deus o ajude também.
Pedro que assistia a tudo
quietinho, interrompeu o diálogo pu-xando o vestido da mãe.
__ Mamãe, esse dinheiro dá pra gente comprar o remédio da tia?
Dona Glória, sem nada dizer, balançou afirmativamente com a cabeça e de seus
olhos rolaram lágrimas, lágrimas de uma criatura sofredora, marginalizada
por uma sociedade egoísta e indiferente aos seus semelhantes.
__ Que remédio é esse, Dona Glória?
__ Minha irmã sofre do coração e precisa tomar pra ele conti-nuar batendo
certo.
__ Olha, vamos combinar uma coisa: A senhora fica com mais esta outra nota
igual e compra o tal remédio. Certo?
Soluçando muito, Da. Glória esticou sua mão para um aperto de mãos e Olavo
puxou-a para um abraço emocionado. Ela falou baixinho ao pé do seu ouvido: O
Sr. é um enviado por Deus!
__ Ide em paz e não desista jamais!
Lá se foram mãe e filho de mãos dadas para prosseguir o ca-minho que a eles
foi destinado, caminho árduo e que somente os fortes são capazes de
percorrê-lo até seu final, levantando-se a cada queda sem quaisquer mãos
para ajudá-los e se reerguerem.
Nesse exato instante, o sino da igreja badalou 12:00h e Olavo apressou-se
rumo à pousada. Hora do almoço! Hora de encontrar Marcela! Passadas largas,
coração acelerado, carregado de felicida-de e esperanças...
FIM DA QUARTA PARTE