Vento que chega,
indeciso, disfarçado
em frívola brisa. Do sul traz nuvens, já
pintadas de melancólico cinza de outono.
As praças recolhem sua alegria e, vazias,
os observam indiferentes.
Da janela
acompanho seu rude caminhar.
Torrencial chuva fria, agora o acompanha.
Árvores, nuas e açoitadas, deixam escapar
súplicas de clemência. Mas não as ouve...
Preocupado,
sinto medo de que leve em
sua louca corrida, minhas recordações
do passado ou as marcas profundas dos
amores ainda vivos em meu coração.
Contrito, busco
mágica oração que o induza
a poupar minhas líricas riquezas. Com fervor,
por entre os lábios ressecados pela angústia
da possível perda, suplico:
- Deixe, Vento,
neste peito amante, as
marcas dos velhos amores que ainda
se abrigam nos mistérios do meu ser.
- Deixe, também,
Vento, as sublimes
recordações do tempo em que eu não
sentia o seu nefasto passar.
Sem elas, amigo,
para que viver?
Melhor será,
enfim, que leve em seus braços
os restos de mim e os deposite, com cuidado,
em terras férteis que aceitem em seu ventre,
minhas sofridas sementes de re-lembrar e de
re-amar...
Domingos Alicata
Rio de Janeiro - RJ - 06/09/2005
Fundo Musical: Noturno Opus 2 - Chopin
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