As três crianças, duas meninas e um menino,
pediram um presente de Natal quando nem era Natal.
O garoto
pediu um carrinho de madeira; uma das meninas, a mais nova,
pediu uma fita cor de rosa para enfeitar o seu cabelo louro
com um laço de cada lado e a
outra, um vidro de esmalte cor de rosa
- existente até hoje, o natural da Colorama.
Com o passar dos dias, mais ansiosos ficavam.
A mãe daquelas três crianças já iniciara os preparativos
para a comemoração, curtindo doces dos mais
variados: de figo, de laranja,
de cidra, de mamão maduro, a muraba apreciada
pelos libaneses e outros tantos.
Os amargos eram diariamente fervidos para
que o amargor
saísse e os demais eram curtidos ao sol, envolvidos com açúcar cristalizado,
em tabuleiros enormes, até sua secagem.
O forno do fogão a lenha era constantemente abastecido com achas de lenha,
para que se mantivesse sempre
quente.
Os suspiros eram assados e, nas compoteiras, colocados os doces em calda
-
coco com gema, leite, baba de
moça, ambrosia, etc.
Matava-se o porco caturra que vinha sendo engordado há alguns meses
e sua carne era parte assada e armazenada em latões
com torresmo e banha
e parte moída para a famosa linguiça pura de porco,
temperada com as especiarias apreciadas pelo povo daquela região,
não faltando
a salsinha, cebolinha e um toque de pimenta malagueta,
curtida na fumaça que saía do fogão a lenha.
Era grande a movimentação durante todo o mês de dezembro
e aquelas crianças não pensavam em outra coisa que não
fosse
os presentes que haviam pedido e que eram do conhecimento
dos pais e dos amiguinhos.
Finalmente chegara o dia 24.
Até o apetite, sempre voraz, desaparecia, tal a ansiedade delas.
Naquela localidade não havia ceia na véspera, mas, no dia 25,
o almoço tinha tudo o que havia do bom e do melhor,
nada faltando.
Na véspera do Natal, as três crianças eufóricas, assim que anoitecia,
colocavam os seus velhos e surrados chinelos
atrás da porta, porque não tinham sapatos.
Iam dormir, mas, cadê o sono?
Não vinha, porque a euforia não permitia.
Assim que amanhecia o dia 25, todas as crianças saíam à rua para brincar
e o barulho dos carrinhos
chamava a atenção.
Aquelas três crianças acordavam da noite mal dormida e corriam
até a porta para procurar os presentes sobre os seus
chinelos,
para que pudessem exibi-los para os amiguinhos.
Mas os chinelos estavam vazios, no mesmo lugar, sem coisa alguma sobre eles.
Tristes, sentavam-se à soleira da porta da sala e ficavam
olhando os seus amiguinhos brincarem.
Nunca houve presentes de Natal para aquelas três crianças:
o menino fabricava os seus carrinhos
com
caixas de sapatos ou madeira que ganhava;
a menina mais velha, jamais conseguiu o seu vidro de esmalte
cor de rosa e a outra menina morreu.
Para ser
sepultada, finalmente, teve enfeitados os seus cabelos louros
com os dois laçarotes de fita cor de rosa, um de cada lado.
Como essas crianças, ainda existem muitas outras... mas quem se importa?
Ninguém!
Autora:
MariaTomasia
Fundo Musical: Natal das Crianças - Simone
Arte e Formatação:
AugustaBS