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Dr. Drauzio Varela - Publicado em 09/08/2016 Publicado no Site em Abril de 2017
As drogas causadoras de dependência ativam o
sistema de recompensa exis-tente no cérebro. O prazer intenso dá origem ao aprendizado associativo (droga-prazer-dro-ga), que constitui a base do condicionamento. Com a repetição da experiência, os neurônios que liberam dopamina já co-meçam a entrar em atividade ao reconhecer os estímulos ambientais e psicológicos vividos nos momentos que antecedem o uso da substância, fenômeno conhecido popularmente como fissura. É por esse mecanismo que voltar aos locais em que a droga foi consumida, a presença de pessoas sob o efeito dela e o estado mental que predispõe ao uso pressionam o usuário para repetir a dose. O condicionamento que leva à busca da droga fica tão enraizado nos circui-tos cerebrais, que pode causar surtos de fissura depois de longos períodos de abstinência. A pessoa deixa de ser usuária, mas a dependência persiste. As recompensas naturais – como aquelas obtidas com alimentos saborosos e o sexo – também estão ligadas à dopamina, mas, nesses casos, a liberação é interrompida pela saciedade. As drogas psicoativas, ao contrário, armam curtos-circuitos que bloqueiam a saciedade natural e mantêm picos elevados de dopamina até esgotar sua produção. Por essa razão, comportamentos compulsivos por recompensas, como comi-da e sexo, são mais raros do que aqueles associados ao álcool, nicotina ou cocaína. O condicionamento empobrece os pequenos prazeres cotidianos: encontrar um amigo, uma criança, a beleza da paisagem. No usuário crônico, os sistemas de recompensa e motivação são reorienta-dos para os picos de dopamina provocados pela droga e seus gatilhos ante-cipatórios. Com o tempo, a repetição do uso torna os neurônios do sistema de recom-pensa cada vez mais insensíveis à ação farmacológica da droga, fenômeno conhecido como tolerância. A tolerância reduz o grau de euforia experimentado no passado, aprofunda a apatia motivacional na vida diária e leva ao aumento progressivo das doses e às mortes por overdose. É por causa da tolerância que todo maconheiro velho se queixa da qualida-de da maconha atual. Como parte desse mecanismo, os neurônios que formam o sistema antirre-compensa ficam hiper-reativos. A sensação de prazer, agora mais fugaz e menos intensa, vem seguida de uma fase disfórica, que se instala no espírito do dependente, assim que o efeito da droga se dissipa. A pessoa deixa de buscá-la simplesmente pelo prazer do efeito, mas para fugir da apatia e depressão que a atormentam, quando ele se esvai. A produção deficitária de serotonina resultante do uso crônico também se instala no lobo pré-frontal, área do cérebro que modula a flexibilidade, a seleção e a iniciação das ações, a tomada de decisões e a avaliação dos erros e acertos. O desarranjo das sinapses dos neurônios pré-frontais enfraquece a resistên-cia aos apelos da droga, mesmo quando a intenção de abandoná-la é verda-deira. As alterações dos circuitos pré-frontais, ao lado das que acontecem na circuitária responsável pelas sensações de prazer, recompensa e respostas emocionais, tecem o substrato para a instalação gradual do comportamento compulsivo, descontrolado, que compromete a motivação para enfrentar a abstinência, mesmo diante de consequências pessoais catastróficas. Da mesma forma que nem todos correm igual risco de desenvolver diabetes ou doença cardiovascular, apenas uma minoria dos que usam drogas psicoa-tivas se torna dependente. A suscetibilidade é atribuída à genética e a diferenças na vulnerabilidade. Fatores que aumentam o risco incluem história familiar (hereditariedade e criação), exposição em idade precoce (adolescência é o período mais vulne-rável), características do meio (ambientes estressantes, violência domésti-ca, desorganização familiar, convívio com usuários) e transtornos psiquiátri-cos (depressão, psicoses, ansiedade). Os estudos mostram que cerca de 10% das pessoas expostas às drogas psico-ativas se tornarão dependentes. No caso da nicotina esse número é cinco a seis vezes maior.
Colaboração da amiga Aliene Santos Fonte: https://drauziovarella.com.br/drauzio/artigos/dependencia-quimica-neurobiologia-das-drogas/
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