Ao clarear de cada manhã, eu era despertado por um sabiá que se degladiava com sua imagem
refletida no vidro da janela de meu quarto.
Imaginava ele ser um intruso em seu território e os embates eram incansavelmente sucessivos. O impacto de seu corpinho contra a vidraça era
uma luta inglória mas ele não desistia em sua tentativa de vencer o atrevido invasor.
Eu acordava logo com o barulho da primeira investida e, deitado, apreciava o debalde duelo. A janela é daquelas tipo guilhotina e com o frio reinante
aqui na serra, tenho-a sempre abaixada.
Esta manhã meu sabiá guerreiro tragicamente perdeu a batalha pa-ra sua própria imagem. Na terceira investida, com a avidez um im-pacto mais forte,
quebrou seu pescocinho e caiu inerte na área externa. Sem que acontecesse o quarto ataque, abri a janela e vi seu pequeno corpinho caído ao chão.
Atravessei a sala rapidamente, destranquei a porta e corri até ele. Peguei-o com o máximo carinho; ainda quente ele estava e sua ca-beça pendida de lado,
não mais sustentada pelo pescoço partido, evidenciava sua morte. Os olhinhos
semiabertos pareciam ainda me olhar mas a opacidade deles me dizia que nada
viam. Sob minhas lágrimas, teve um funeral condigno de um guerreiro, sepultado no canteiro de roseiras.
A você, meu amiguinho de todas as manhãs, rendo minha derradei-ra homenagem com esta singela estrofe que segue abaixo:
MEU QUERIDO SABIÁ GUERREIRO, VALENTE, LUTADOR,
GANHASTE DE MIM ADMIRAÇÃO, RESPEITO E MEU AMOR!
AMANHÃ NÃO MAIS TEREI TEU AGRADÁVEL DESPERTAR
E SEI QUE VOU CHORAR TUA FALTA, LOGO AO ACORDAR!
Ary Franco
(O Poeta Descalço)
Fundo Musical: All the way - Ernesto Cortázar