Menino de Rua
Menino de rua, sem
futuro, sem destino
Abandonado, vagas ao leu, em desatino.
Nada podes esperar do teu incerto porvir.
Muito choras, pouco tens que te faça rir.
Vítima de um lar sem
berço e desfeito.
Lançado à rua, sem um beijo nem carinho.
Buscas em desespero um rumo em teu caminho,
Mas tua bússola só te leva a atos mal feitos.
Só te viram as costas
nesta nossa sociedade.
Não te dão chance de alcançares a felicidade.
Sem abrigo à noite, tens por teto apenas a lua.
Pobre menino de rua, que triste sina a tua.
Ary Franco
Frente e Verso
(Crônica)
Depois que escrevi o poema acima, lembrei-me do
preconceito que
temos com os meninos de rua e os alertas que recebemos
sobre a má índole
deles (injustamente generalizada). Cuidado! Se você parar em um semáforo
e
não der um trocado, eles jogam ácido no seu rosto ou te ferem com
um caco de vidro... Quando você estacionar em algum lugar e não deixar
que eles tomem con-ta, na volta teu carro vai estar arranhado ou com um pneu
fura-do...
Tempos atrás, quando morava na cidade do Rio de Janeiro,
di-rigindo-me à casa de meus pais, no bairro de São Cristóvão, próxi-ma
à Quinta da Boa
vista, fui obrigado a parar num sinal verme-lho e fui
abordado por um menino
de uns seis anos, mais ou menos.
_ Moço... me dá um real?
_ Qual é o seu nome?
_ Daniel
_ Quantos anos você tem?
_ Anda logo, moço. Tenho que pedir três carros em cada
si-nal, senão
mamãe briga comigo!
Dei o real que estava no cinzeiro e ele foi correndo pro carro que estava
atrás do meu. Reparei uma senhora, parada na esquina oposta do
cruzamento, e achei que era ela a mãe do menino. No si-nal verde
prossegui e estacionei um pouco mais adiante, voltando a pé para o
cruzamento, dirigindo-me à tal senhora. Durante minha caminhada, escutei um barulho de batida
de
carros no cruzamento seguinte, mas prossegui no meu intento.
_ Boa tarde, a senhora é a mãe daquele menino? Perguntei apontando
para o Daniel.
_ Você é da puliça?
_ Não, sou apenas uma pessoa querendo ajudá-la. A senhora não acha
o Daniel muito pequeno para se arriscar no meio do trân-sito, em busca de
uns
trocados?
_ Achu sim, mas nós semos em cinco e tenhu qui levá dinheiro pra
casa.
_ Seus outros filhos estudam?
_ Não, eles tão em outros sinal. Si eu não levá dinheiro pra
casa, pro
meu marido bebê cachaça, ele quebra tudo e bate im nóis. Mais um dia isso
vai cabá, o meu mais véio sempre diz, quan-do
eu apanho: Não chora não
mãe, quando eu crecê eu vô matá ele. Ele tá com quinze ano,
limpa os vidro
dos carro e já pensou inté em rôbá, quando num consegue o dinheiro nu
finar
du dia.
Bom, deixando minha decisão nas mãos de Deus, dei uma nota (o valor
não interessa) à tal senhora e ela, num esforço supremo, por
não estar acostumada a sorrir, sorriu. Pareceu-me ver alguns cacos
de dentes em sua boca
mas não posso afirmar que o fossem.
_ Brigada, moço. Agora vô tê qui trocá essa nota em
bastante miúdu
pra dar pra muitos dia. Deus pague o sinhor!
_ ÔH DANIEL! Gritou ela: VAMU IMBORA!
Eu voltei pro meu carro e sorri. No limpador do para-brisa es-tava
uma
multa por estacionamento em local irregular. Olhei pa-ra o alto e pensei:
“Desculpe-me Senhor, mas esta eu não enten-di...” Sei que
deve haver alguma explicação ou uma mensagem Sua para mim. Perdão por
não ter entendido. Sei que mais adiante sa-berei a resposta!
Deixei a multa onde estava e fui para a esquina onde tinha
ocorrido o
acidente. A ambulância dos bombeiros estava chegan-do e eu dirigi-me ao
guarda de trânsito.
_ Foi o sr. que multou meu carro? Apontando para o meu Gol verde.
_ Fui eu sim. Ali é “Carga e descarga”. Mas eu estou vivo por ter ido
multar seu carro. Estes carros esmigalharam o muro desta
esqui-na em que fico. O azulzinho avançou o sinal e acabou com o outro. Não tinha
dado tempo
de eu sair fora. Felizmente ninguém morreu. Só os motoristas é que ficaram
bem feridos.
_ Você está com a multa aí?
_ Não, está lá no para-brisa do carro.
_ Olha, me faz um favor: busca ela pra mim, não
precisa mais pagar.
Quero guardar esta multa comigo, como recordação
do dia que escapei de
morrer. Vou arrancar a cópia dela do meu talão – OK?
Voltei ao carro jurando que aquela placa de “Carga
e Descar-ga” foi
colocada depois que eu estacionei. Como é que eu não a tinha visto?
Peguei a
multa e levei-a ao guarda. No seu crachá es-tava o nome Alexandre.
_ Obrigado, Alexandre! Olha, meus pais moram logo ali e não vou conseguir passar com o meu carro nessa confusão. Vou a pé fa-zer uma
visitinha a
eles e volto já. Posso deixar o carro onde está? É rapidinho...
_ OK! Deixa o “pisca alerta” ligado e não demora,
certo?! Po-de me
chamar de Alex. Tô sempre por aqui...
Caminhando, pensei: Se eu não estacionasse o
carro pra falar com a
mãe do Daniel, teria sido eu o abalroado no acidente e o Alex teria morrido.
Olhei para o alto e pensei em voz alta: Se-nhor, não precisava me explicar,
tão depressa!
Aí avistei meus pais que estavam na porta do prédio em que moravam
e tinham escutado o barulho da “batida”. Pedi a benção, abracei e beijei os
dois soluçando. Mamãe perguntou pelo meu car-ro e eu disse
que estava logo
ali, com uma Pessoa Muito Especial tomando conta dele. Então
ela pediu-me
para entrar pra tomar um copo d’água com açúcar, pois eu estava
muito nervoso.
Bom, aqui termina o relato fiel de uma lição
do Nosso Criador que
passo para vocês em forma de crônica. Fiquem com Deus!
Ary Franco
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