Eu olhava fascinada para o muro de avencas, forte,
magistral e imponente, no fundo de nossa casa.
Acima do muro, do alto
dos meus cinco anos, eu podia ver uma pequena parte da casa da Dona
Iria, minha amiga querida e ferrenha defensora da garotinha levada que
eu fui.
Ficava na porta da cozinha olhando as avencas.
Como é que elas
foram parar lá?
Não foi mamãe quem as plantou...
Mesmo que ela subisse
numa escada enorme ele não alcançaria os buraquinhos de onde elas
nasciam!
O fascínio pelo que é bonito, correto e bom nasceu
comigo.
Não falo de peças, quadros ou casas imponentes não... e sim da
beleza que a natureza nos dá de presente.
Mamãe trabalhava muito e o
fogão de lenha ficava a alguns metros do muro de avencas.
O espaço
entre o muro de terra forte e verdinho era mais ou menos de meio metro.
Do outro lado da casa, uma pequena horta.
Eu adorava o cheiro da lenha
queimando no fogão.
Mamãe passava roupas com a brasa que o fogão lhe
dava, num ferro mais pesado que o braço dela.
Fazia pão de casa, hábito
que minha irmã Cecília ainda mantém na família.
Hoje mamãe ganha os pães
mas ainda passa sua própria roupa, com 84 anos.
Um dia ela aprendeu a
fazer balas de coco, um tipo de puxa-puxa fantástico.
Com manteiga e
outros ingredientes que eu não entendia, a bala ia formando uma fita
enorme; de início de cor marrom... aos poucos ia tomando uma tonalidade
prateada, lindo demais.
E eu olhando, fascinada.
Depois, nossa mãe as
cortava cuidadosamente, depois de um trabalho exaustivo demais.
Quando
acordávamos no outro dia, as balinhas estavam bran-quinhas como neve,
deliciosas... mamãe nos dava algumas delas e levava o resultado de seu
árduo trabalho para o bar do papai, onde éramos terminantemente
proibidas de entrar, a não ser para levar alguns quitutes que mamãe
enrolava num pano de prato bran-quinho e limpo.
Enquanto eu me lembro de tudo com saudade,
gostaria demais de saber se o muro de avencas ainda existe...
(continua...)
Domingo do início do horário de verão, 2009
“Se soubessem como nos
magoam certas coisas, jamais elas seriam sequer cogitadas.”