A Prostituta e Eu


        Meu sol é a lua. Troco o dia pela noite.

       Na penumbra enfumaçada do bas-fond de uma boate de se-gunda categoria onde ela “trabalha”, passo as madrugadas debru-çado no balcão, degustando petiscos alternados com goles de Vodka. Cabelos bem penteados, bigode fino, terno escuro com co-lete, sapato em duas cores, calça boquinha, gravata de seda italia-na com o nó displicentemente afrouxado, compõem a vestimenta característica de um gigolô. De longe e de soslaio observo, enciu-mado, cada uma de suas idas e vindas com parceiros alternados.

Numa relação comprada e paga
Ela passou a ser a minha amada.
Jamais acreditou no meu amor,
Vê em mim apenas seu protetor.

       Como lutador de artes marciais, meu trabalho é facilitado quando necessário se faz aplacar a sanha de algum engraçadinho, por maus tratos ou querer reaver o pagamento adiantado pelo coi-to contratado. Invariavelmente, por precaução, ela frequenta um prostíbulo próximo e numa emergência, dissimuladamente, do ba-nheiro, liga seu celular requisitando “meus eventuais serviços”.

Habitamos sob o mesmo teto.
No leito trocamos nossos afetos.
Mas sinto a dor da minha paixão
Ter em troca apenas compaixão.

       E assim vou amargando meus dias, contendo o que morre emu-decido em meu peito, disfarçando meus prantos em falsos sorrisos, rastejando para que ela se sinta mais alta que eu... Tudo pelo pri-vilégio de poder manter ao meu lado minha amada prostituta.

Ary Franco
(O Poeta Descalço)



Fundo Musical: Deslizes - Fagner
 

 
Anterior Próxima Contos Menu Principal