Morrer carbonizado em
Paris...
É chic, très chic.
E bem melhor que se consumir em inanição,
no pátrio chão da África.
Morrer carbonizado em
Paris,
é garantia de ter nome nos jornais.
Se fosse em terra negra,
corpos caídos são o pasto de chacais.
Sem quaisquer “ais”.
Viver achincalhado no
grand monde,
é chic, très chic.
Mesmo discriminado,
sempre humilhado,
ghetorizado...
Jamais, amado!
Reclamar, pour quoi?
Afinal, em Paris,
la vie é rose.
E essa negrada,
que prolifera qual ratos
(o francês, procria, avec élégance),
distoa.
Só não distoa...
A lembrança de ex-colônias saqueadas,
pilhadas,
sugadas em seus corpos, em suas almas
(e depois, abandonadas),
para que le roi viva avec beaucoup de plaisir.
Mas essa é a obrigação
do negro:
ser escravizado,
sufocado,
aniquilado.
E dar-se por satisfeito
quando uma autoridade,
em branquíssima oratória,
murmurar “perdão”, “obrigado”!
Esta noite, em meu
sonhar,
vi Deus abrir-se em sorriso
a anjos de asas queimadas,
faces morenas, magoadas,
pequenos senegaleses,
recém-chegados da França.
Até quando, meu Senhor,
toda essa incompreensão,
que amarelo, branco ou negro,
vermelho, ou qualquer cor de pele...
Ser humano não é raça,
ser humano é, sempre, irmão.
Que há de haver cuidado, zelo,
e um fraterno conviver;
que, sob o céu, tudo é a pátria
que remiste com Teu sangue,
que te deste, por inteiro,
a toda esta humana nação?
Até quando, Pai Eterno,
tanta discriminação?
- 14 crianças do
Senegal e Mali, vivendo numa ratoeira
parisiense,
sob os auspícios do
governo daquele País,
morreram carbonizadas,
além de outros adultos.
E senti tanta tristeza, ao pensar nos que
imigram em busca de vida melhor.-
Escrito em 27 de agosto,
este poema é cada vez mais atual...
Patrícia Neme
Fundo Musical: Marseille |