No Tempo da Minha Infância
Ismael
Gaião
No
tempo da minha infância nossa vida era normal.
Nunca me foi proibido comer muito açúcar ou sal.
Hoje tudo é diferente sempre alguém ensina a
gente que
comer tudo faz mal.
Bebi leite ao
natural da minha vaca Quitéria e nunca
fiquei de
cama com uma doença séria.
As crianças
de hoje em dia não bebem como eu bebia pra não
pegar bactéria.
A barriga da miséria tirei com
tranquilidade, do
pão com manteiga e queijo hoje
só resta a saudade.
A vida ficou sem graça não
se pode comer massa por causa da obesidade.
Eu
comi ovo à vontade sem ter contra indicação.
Pois o tal colesterol pra mim nunca foi vilão.
Hoje a vida é uma loucura dizem que qualquer
gordura nos
mata do coração
Com a modernização quase
tudo é proibido.
Pra tudo tem uma Lei que nos
deixa reprimido.
Fazendo tudo que eu fiz hoje me
sinto feliz só por ter
sobrevivido.
Eu nunca fui
impedido de poder me divertir.
E nas casas dos
amigos eu entrava sem pedir.
Não se temia a
galera e naquele tempo era proibido
proibir.
Vi o meu pai dirigir numa total
confiança.
Sem apoio, sem airbag sem cinto de
segurança.
E eu no banco de trás, solto
igualzinho aos demais, fazia
a maior festança.
No meu tempo de criança, por ter sido reprovado
ninguém ia
ao psicólogo, nem se ficava frustrado
quando isso acontecia,
a gente só repetia até
que fosse aprovado.
Não tinha superdotado nem a
tal dislexia.
E a hiperatividade é coisa que não
se via.
Falta de concentração se curava com
carão.
E disso ninguém morria.
Nesse tempo se bebia água vinda da torneira de uma fonte
natural ou até de
uma mangueira.
E essa água engarrafada que
diz-se esterilizada nunca entrou
na nossa feira.
Para a gente era besteira ter perna ou braço
engessado,
ter alguns dentes partidos ou um
joelho arranhado.
Papai guardava veneno em um
armário pequeno sem chave
e sem cadeado.
Nunca
fui envenenado com as tintas dos brinquedos.
Remédios e detergentes se guardavam, sem
segredos.
E descalço, na areia eu joguei bola de
meia rasgando as
pontas dos
dedos.
Aboli
todos os medos apostando umas carreiras em
carros
de rolimã sem usar cotoveleiras.
Pra
correr de bicicleta nunca usei, feito um atleta,
capacete e joelheiras.
Entre outras brincadeiras
brinquei de carrinho de mão,
estátua, jogo da
velha, bola de gude e pião, de mocinhos
e
cowboys e até de super-heróis que vi na
televisão.
Eu cantei Cai, Cai Balão, Palma é
palma, Pé é pé, Gata Pintada,
Esta Rua, Pai
Francisco e De Marré.
Também cantei Tororó.
Brinquei de Escravos de Jó.
E o Sapo não lava o
pé. Com anzol e jereré.
Muitas
vezes fui pescar e só saía do rio pra ir
pra casa jantar.
Peixe nenhum eu pegava mas os
banhos que eu tomava dão
prazer em recordar.
Tomava banho de mar na estação do verão quando
papai nos levava em cima de um caminhão.
Não
voltava bronzeado mas com o corpo queimado
parecendo
um camarão.
Sem ter tanta evolução
o Playstation não havia e nenhum
jogo
de vídeo naquele tempo existia não tinha vídeo
cassete
muito menos internet como se tem hoje em
dia.
O meu cachorro comia o resto do nosso almoço.
Não existia ração
nem brinquedo feito osso.
E para as pulgas matar
nunca vi ninguém botar
um colar no seu pescoço.
E ele achava um colosso tomar banho na
mangueira ou
numa água bem fria debaixo duma
torneira e a gente
fazia farra usando sabão em
barra pra tirar sua sujeira.
Fui
feliz a vida inteira sem usar um celular.
De
manhã ia pra aula mas voltava pra almoçar.
Mamãe
não se preocupava pois sabia que eu chegava
sem
precisar avisar.
Comecei a trabalhar com oito
anos de idade, pois o meu pa
me mostrava que
pra ter dignidade o trabalho era importante
pra não me ver adiante ir pra marginalidade.
Mas
hoje a sociedade essa visão não alcança e proíbe
qualquer
pai dar trabalho a uma criança.
Prefere
ver nossos filhos vivendo fora dos trilhos num
mundo sem esperança.
A vida era bem mais mansa, com um pouco de insensatez.
Eu me lembro com detalhes de tudo que a gente fez, por isso
eu tenho saudade e hoje sinto vontade de
ser criança outra vez
***
Fundo Musical: Atirei o pau no gato
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