Essa Tal de
Culpa
Ana
Jácomo
Troço
perigoso, a culpa. Faz estrago à beça. Pode até
aniquilar uma existência inteira. A
vida fica toda encolhidinha. A alma deixa de
cantar. As veias por onde o amor circula se tornam
obstruídas. É
capaz de fazer adoecer o corpo que a gente vê e
aquele que só dá pra sentir.
Perspicaz, inventa desculpas
para as pessoas não serem felizes, as mais fajutas
e as mais aprimoradas. Aqueles que se enredam
nela, acabam muitas vezes não sendo mesmo,
iludidos com a convicção da sua fala que repete
baixinho que não podem. Não devem. Não
merecem.
Por
causa dela, muita gente linda amordaça seus
sonhos. Coloca a alegria na prateleira mais alta.
Esconde sua própria caixa de lápis de cor.
Especializa-se em criar nuvens toda vez que o sol
se insinua. Nódoa que pede limpeza, dor que
aguarda cura. A culpa é uma espécie de dívida
pendente que parece não poder ser paga nunca.
E, por
mais estranho que seja, algumas vezes nem se sabe
direito quem é o credor, se é que realmente existe
um.
Nem
sempre a culpa está relacionada a erros cometidos,
passíveis de serem transformados pelo perdão. Ela
pode ter a ver com falhas imaginárias, criadas
pela confusão, pela impossibilidade de atender à
expectativa alheia, pela manipulação, pela
ausência de autoamor. É como um quarto fechado que
cheira a mofo e tem uma única janela, geralmente
emperrada, que precisa ser aberta para se sair de
lá. Essa janela abre na direção da gentileza com a
própria vida, a única credora de verdade, na
maioria das
vezes.
***
Texto recebido do Luiz
Nicolau
Ilustração:
Aliene
Imagens:
Internet
Fundo Musical: Tears - Ernesto Cortázar
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