No ano de 1975 eu e minha família viemos para o
subúrbio do Rio de
Janeiro onde moramos até hoje. Temos um bar e na calçada, duas enormes
amendoeiras nos ofereceram suas sombras amigas durante esses 33 anos. No verão,
as árvores da altura de um edifício de três andares, bloqueavam corajosamente, com suas folhas douradas, o sol que batia de
frente durante toda a
tarde, refrescando o nosso apartamento e protegendo com suas sombras amigas os fregueses do bar e os nossos vizinhos. Meu marido, João,
construiu um
banco de cimento em volta dos seus troncos e os vizinhos reuniam-se ali, todas as tardes de verão, aproveitando a brisa fresca que as sombras das
árvores
ofereciam e fugindo do calor infernal do Rio de Janeiro. Os bancos em volta
das amendoei-ras tornaram-se um ponto de encontro, aonde os vizinhos e fregue-ses vinham conversar e contar as últimas novidades. As
conversas estendiam-se até altas horas, quando a noite começava a refres-car!
Em seus enormes galhos, os passarinhos faziam enorme
algazar-ra às
seis horas da manhã, saudando a chegada de um novo dia e às dezoito horas,
anunciando a chegada da noite. Era uma maravilho-sa sinfonia de
pardais, rolinhas e sabiás!
Mas, com a chegada do inverno, esses mesmos vizinhos, esque-cendo o
bem que recebiam no verão, reclamavam o tempo todo das
folhas que caíam pelo chão. Não gostavam de ter que varrer as calçadas de
manhã e à tarde! Alguns ficavam muito zangados, ameaçando matar as amendoeiras.
Já estávamos acostumados com estas reclamações e as
ouvía-mos com
paciência, pois sabíamos que tão logo o tempo esquentas-se, trazendo ondas
de calor intenso, as reclamações cessariam e os vizinhos voltariam às suas
conversas junto aos troncos das amen-doeiras.
Infelizmente, alguém não dava a mínima importância para a sombra
que as árvores nos davam e um dia, as pobres amendoeiras amanheceram
com
a metade dos troncos, descascados, feridas mortalmente por
algum covarde
que agiu na calada da noite!
Meu marido tentou de todas as formas, até mesmo através de órgãos
públicos, salvá-las. Mas, a sua luta foi inútil! Especialistas
em botânica foram
unânimes em afirmar que as árvores estavam morrendo. Não
havia mais nada
que se pudesse fazer.
Foi com muita tristeza, que vimos primeiro, os passarinhos irem embora, depois, todas as suas folhas caírem, as cascas
dos troncos começarem a
soltar-se e a espedaçarem-se pelas calçadas. Desola-dos, assistíamos impotentes, a morte lenta das árvores!
Hoje, dia 22 de setembro de 2008, ao olhar da minha janela, surpreendi-me ao olhar as amendoeiras. Dos galhos secos de cada árvore, como
se ambas houvessem combinado, brotou uma plan-tinha que
desconheço o nome,
com inúmeras e pequeninas flores amarelas! Lindas!
Tomada de emoção indescritível, chorei ao perceber que era o
último
grito de socorro de duas árvores agonizantes!
Último soluço de quem não consegue compreender a malda-de do ser
humano!