Pena não ter sido filmado, homologado ou constar do Livro Guinness.
Chovia a cântaros naquela tarde cinzenta e eu, por força de um
compromisso comercial inadiável, seguia bravamente entre raios e
trovões rumo ao meu destino sob um guarda-chuva incapaz de
abrigar-me da cintura para baixo; vez por outra uma lufada mais
forte tentava arrancá-lo de minha mão.
Rios d’água escorriam junto ao meio-fio em busca desesperada dos
bueiros que os engoliam com sofreguidão incontida e insaciá-vel.
Tinha que atravessar a rua e comecei a procurar um local me-nos
encharcado e que não me obrigasse a ensopar meus sapatos, mais do
que já estavam.
Aqui! Não, aqui não pode! Ali! Não, ali está inviável! Mais adi-ante!
Sim, mais adiante vai dar. Pulo ou não pulo o riacho?
Foi em meio àquela dúvida cruel que aconteceu o inusitado! Um sádico
transformador dissimuladamente instalado no alto do poste em que
estava eu bem embaixo, resolveu EXPLODIR! Aquele estrondoso “bum”
deu-me tamanho susto que atravessei a rua to-cando com os pés apenas
duas vezes na rua e estatelando-me sobre as pessoas que estavam
abrigadas sob a marquise na calçada opos-ta.
Arfante e pálido fui ironicamente aplaudido pelos que me “re-cepcionaram”
e comentaram meu feito olímpico, de fazer inveja a qualquer canguru
australiano. Ainda meio apatetado, entre um sor-riso amarelo,
agradeci.
“Você acabou de bater o recorde mundial de
salto triplo, sem tomar distância para impulsão e sem uma caixa de
areia para amaciar sua aterrissagem. Parabéns!”, disse-me um
dos gozadores que riam a bandeiras despregadas do susto que levei.
Some-se a isso o fato de, ao invés de um calção, estava eu trajando
um terno molhado e usando uma incômoda gravata.
Na época este que vos escreve deveria ter uns vinte e três anos.
Hoje já passei dos oitenta, mas ainda lembro com orgulho desse meu
feito retumbante!
Nota: Aos mais detalhistas e curiosos,
esclareço que não sei onde foi parar meu guarda-chuva!